Agosto-rei
Em Agosto, lânguido rei do Verão, mês de areias, águas, malas e viagens, escrevemos e lemos, mas quase desaparecemos de cena. A agenda há-de voltar a encher-se em Setembro, em eventos individuais e várias conversas acompanhadas. Até lá, aproveitem para nos ler, no mais recente romance da Catarina Costa, acabado de lançar pela Guerra e Paz “E Então, Lembrei-me”, do qual aqui damos conta, ou em três títulos estreados no passado Outono que vale a pena destacar, da autoria de Rita Cruz, Mafalda Santos e Gabriela Relvas. Pelo meio, a Filipa Fonseca Silva continua a divulgar as raízes desta ideia de união, na imprensa e na televisão, a Gabriela Ruivo fala, no seu Alentejo, sobre a sua criação literária e os interessantes projectos em que está envolvida e duas escritoras do clube são finalistas do Prémio Literário Fundação Eça de Queiroz: quem são e quais as obras, já sabem?
Boas leituras!
Clube das mulheres escritoras
Agenda
15 de Agosto
Joana Kabuki | Feira do Livro de Sesimbra | 21h30 | Apresentação do Livro “Viradas do Avesso” e Conversa com a Booktuber Maria João Covas
31 de Agosto
M.G Ferrey | Evento Book 2.0 | 10H | Painel “Books: For Your Own Physical and Mental Health” com Daniel Sampaio
Entrevistas
O que é o Clube das Mulheres escritoras? A porta-voz do grupo, Filipa Fonseca Silva, responde num artigo para o Jornal de Notícias.
«O Clube das Mulheres Escritoras foi como uma agulha que rebentou a minha bolha e a de outras 30 mulheres, que sentiam exactamente o mesmo e que pairavam por aí, sem que ninguém se desse conta. Percebi que todas tínhamos as mesmas frustrações, as mesmas lutas, os mesmos sonhos e que havia muitas mais vozes femininas na literatura do que aquelas que eu própria conhecia. »
Filipa Fonseca Silva fala sobre o seu último livro « E se Eu Morrer Amanhã?» com Ana Daniela Soares no programa Todas as Palavras da RTP
Gabriela Ruivo em entrevista ao Diário do Alentejo
“Mapas do confinamento”. Como nasceu este projeto e como foi agregar autores de várias geografias?
Sou co-fundadora deste projecto com o meu amigo Nuno Gomes Garcia, escritor português residente em Paris. Surgiu da nossa necessidade de fazer alguma coisa durante a pandemia que pudesse servir de memória futura dos tempos de confinamento. Conseguimos reunir mais de uma centena de artistas de língua portuguesa, entre escritores, poetas, artistas plásticos e fotógrafos, e também tradutores para inglês, francês e chinês. Somos uma comunidade muito rica e diversificada. Podem visitar-nos em www.mapasdoconfinamento.com/.”
Prémios
Foram anunciados os cinco finalistas do Prémio Literário Fundação Eça de Queiroz 2023, que distingue obras de ficção publicadas entre 2021 e 2022 de autores com menos de 40 anos. Entre as obras finalistas encontram-se duas da autoria de escritoras do nosso Clube: “A História de Roma” de Joana Bértholo e “Periferia” de Catarina Costa.
O vencedor será anunciado em setembro.
Livros: Lançamentos
E Então, Lembro-me, Catarina Costa
Catarina Costa publica o seu segundo livro de ficção E então, lembro-me pela Editora Guerra e Paz.
Laila acorda na cama de um hospital de uma cidade sitiada. Está amnésica. Uma série de pessoas como ela, a quem lhes foi extorquida a memória autobiográfica, vão parar a esta cidade, com o intuito aparente de servirem de mão-de-obra num complexo fabril.
Presos e forçados a trabalhar nesta cidade onde a lei é administrada por autoridades anónimas, os habitantes tentam entender quem são e de onde vêm. Estarão a ser punidos por serem presos políticos ou por serem criminosos de delito comum? Ou terão sido seleccionados de forma arbitrária?
Ao partilharem recordações fragmentárias e, muitas vezes, perturbantes, procuram criar uma imagem da sociedade a que pertenceram e de onde foram retirados, entre a realidade e a imaginação, a paranoia e o desejo. Ao mesmo tempo, reinventam a própria identidade a partir das narrativas que contam a si mesmos e aos outros sobre quem terão sido e quem poderão ser agora.
Laila, como os outros, tenta recuperar as ruínas do seu passado. Poderão estas protegê-la de um abismo maior?
Livros: Destaques
A Menina Invisível, Rita Cruz
E se, impotente perante a violência, uma menina conseguisse entrar tão dentro da escuridão do corpo até desaparecer nele?…
“Ao segundo romance de Rita Cruz acede-se através de uma prosa subtil e descomplicada, em que a autora consegue o difícil equilíbrio entre situações de superlativa crueldade, e outras de inocência extrema, e nos reconcilia com a vertente humana e imaterial do crescimento, da subjectividade, da crueldade e da morte.” Luísa Mellid-Franco, in Expresso
“No Portugal do século XIX, onde a cada vez mais evidente decadência monárquica só encontrava eco nas aspirações revolucionárias dos republicanos, Alice, uma criança com oito anos, conhece a face mais hedionda dos seres humanos, ao engrossar o rol de vítimas de um criminoso à solta. Enquanto a sua avó é assassinada com requintes de malvadez por uma besta conhecida pelo povo por Carniceiro, Alice é brutalmente espancada e sobrevive de forma quase milagrosa (...) Todavia, as marcas da violência de que foi vítima, essas, perduram e manifestam-se sob a forma de um dom que nasceu da maldição: Alice adquire a capacidade de se tornar invisível aos olhos dos outros, refugiando-se assim do perigo e da crueldade humanas.” Sérgio Almeida, in Jornal de Notícias
Do Outro Lado, Mafalda Santos
“Viver nunca é fácil, muito menos numa distopia em que a vida quotidiana se mistura com o anteriormente inimaginável. Que porvir terão as paixões humanas nesse novo futuro? Mafalda Santos conta-o com agilidade, fala ao ouvido daqueles que a querem ler, adverte, a partir da ficção, que algo está em movimento e é perturbador. «Não somos cegos», parece dizer este Do outro lado, assinado pela escritora Mafalda Santos com confiança e voz própria. Bem-vinda.” Pilar del Rio
«Mafalda Santos publicou em 2021 o livro de contos, Conta-me, Escuridão, 8 contos de “terror” inspirados em 8 quadros, textos que Fernando Ribeiro classificou no “Prefácio” como “tenebrosos e fantásticos” (p. 13), qualificações que, sem favor, se podem estender ao romance da mesma autora publicado em 2022, Do Outro Lado, uma verdadeiramente notável distopia, como Pilar del Río destaca no “Prefácio” e que gostaríamos nós, aqui no JL, de conceder igual destaque. (…) Importante tomar nota do nome da autora, que certamente dará aos leitores muitas alegrias estéticas no futuro.» Miguel Real, in Os Dias da Prosa, Jornal de Letras
Gula de Uma Rapariga Esquelética de Amor, Gabriela Relvas
Ninguém nos prepara para isto, nem o Júlio calado, nem as lágrimas da Cristina, nem a Odete nua no whisky, nem a sola de madeira no osso, as coisas que nos espantam pouco nos imunizam. É como se viver fosse uma prescrição para pessoas mal preparadas, as bem preparadas não as conheço, serão almas que já aqui andaram e que agora nos veem e troçam de nós de perna cruzada no sofá enquanto passamos o chão a esfregona, fantasmas que penetram a parede da sala para dar à cozinha, abrem a porta do frigorífico e riem da marmelada que não solidificou, cacarejam ao ver o cu de quem metemos na cama, que do nosso já não conseguem rir, e bocejam esta frase pronta a causar dano, Ao que tu chegaste. Aquela noite veio a revelar-se na minha mais incompreensível inaptidão.
"Neste romance de estreia, Gabriela Relvas vira tudo do avesso numa linguagem frenética, desprovida de regras e carregada de inconformismo. Sara Branco Bizarro, personagem principal desta história, pinta retratos rápidos de uma trama de segredos que emergem dos lugares mais recônditos da sua existência, numa narração insaciável. Gulosa, a rebentar, ainda que vazia; um isco de ingenuidade gordo de antíteses.
Prestes a fazer quarenta e dois anos, circula no passado por necessidade, põe na mesa a criança que viu o que não devia ter visto.
Um livro vertiginoso e poderoso sobre o que, por vezes, custa ser mulher."